Análise da proposta de lei para modificação das regras da Nacionalidade Portuguesa
NACIONALIDADE PORTUGUESA
6/27/20255 min ler


Os principais pontos da proposta de modificação da Lei da Nacionalidade Portuguesa visam reformular o regime jurídico para garantir uma ligação efetiva e genuína entre o indivíduo e a comunidade portuguesa, combatendo o uso oportunista da nacionalidade. A proposta busca reverter as alterações dos anos recentes (2018, 2020), que, segundo o documento, desvirtuaram o modelo português ao facilitar o acesso à nacionalidade sem um período adequado de residência legal ou integração.
Aqui estão os pontos principais da proposta:
Contexto e Fundamentação da Proposta:
O regime da nacionalidade é um direito fundamental, mas o legislador possui liberdade significativa para definir quem tem direito à nacionalidade portuguesa.
Apesar do princípio constitucional da equiparação de direitos entre portugueses e estrangeiros e apátridas (Artigo 15.º da Constituição), a nacionalidade não é uma condição sine qua non para a integração positiva de imigrantes, o que reforça a liberdade do legislador para modular o acesso.
A proposta considera o Direito Internacional, que exige uma ligação efetiva e um vínculo genuíno entre a pessoa e o Estado para a concessão da nacionalidade, impedindo sua manipulação ou instrumentalização.
O Direito da União Europeia também impõe limites à liberdade dos Estados-Membros, exigindo uma "relação específica de solidariedade, lealdade e reciprocidade" entre o Estado e seus cidadãos, tornando inviável a "comercialização" da cidadania (como nos programas de "cidadania por investimento").
As revisões de 2018 e 2020 são criticadas por terem aberto portas à atribuição e aquisição sem residência legal prévia ou com requisitos drasticamente reduzidos, resultando em um aumento acentuado de nacionalidades concedidas sem ligação sólida, sobrecarga dos serviços públicos e descredibilização das políticas de imigração.
A percepção de "nacionalidade fácil" agravou o efeito de chamada migratória, levando a pedidos não consubstanciados em residência regular ou integração. A nacionalidade portuguesa passou a ser vista como de "conveniência" ou "transacional", sem o vínculo exigido pela jurisprudência europeia.
Tais regimes descredibilizam a nacionalidade portuguesa perante os próprios cidadãos e inviabilizam uma política de imigração consistente, gerando discriminação e o problema dos "bebês-âncora".
Alterações Propostas:
Nacionalidade Originária (Atribuição) – Artigo 1.º, n.º 1, alínea f):
Passa a ser sempre exigida a residência legal de um dos progenitores em território nacional à data do nascimento.
Estabelece-se um prazo mínimo de três anos de residência legal de um dos progenitores no momento do nascimento (onde antes não se exigia prazo para residentes legais ou era exíguo para outros).
A atribuição da cidadania deixa de ser automática (ope legis) e passa a exigir uma declaração positiva de vontade do progenitor.
A prova da residência legal dos pais será feita por documentos que comprovem a legalidade da residência, não apenas documentos de identificação.
A atribuição da nacionalidade a descendentes de portugueses originários de 2.º grau (Artigo 1.º, n.º 1, alínea d)) passará a exigir o preenchimento de requisitos materiais similares aos da naturalização, como conhecimento da língua e cultura, e ausência de condenação criminal grave.
Nacionalidade Derivada (Aquisição por Naturalização) – Artigo 6.º:
Aumento dos prazos de residência legal:
Para cidadãos de países de língua oficial portuguesa, o prazo passa de 5 para 7 anos.
Para cidadãos de outros países, o prazo passa de 5 para 10 anos.
Para apátridas, o prazo será de 4 anos.
Novos requisitos de conhecimento: Além do conhecimento da língua portuguesa, será exigido conhecimento da cultura portuguesa. Também será exigido o conhecimento dos direitos e deveres fundamentais da nacionalidade portuguesa e da organização política do Estado.
Declaração de adesão: Exigência de uma declaração solene de adesão aos princípios fundamentais do Estado de Direito Democrático.
Requisitos criminais mais exigentes: A naturalização será inviabilizada para aqueles condenados a penas de prisão efetiva, sem limite mínimo de tempo (anteriormente, o limite era de 3 anos de prisão).
Naturalização de Menores (Artigo 6.º, n.º 2): Passa a exigir cumulativamente que um dos progenitores resida legalmente no território nacional há pelo menos cinco anos e que o menor esteja inscrito e a frequentar regularmente o ensino obrigatório. Menores que atingiram a idade de imputabilidade penal também devem cumprir os requisitos de não ter condenação criminal grave e não constituir perigo.
Revogação da via para Judeus Sefarditas: O procedimento extraordinário de naturalização para descendentes de judeus sefarditas portugueses é revogado.
Eliminação do mecanismo de naturalização de ascendentes em situação irregular: O mecanismo que permitia a naturalização de ascendentes em situação irregular, como consequência da cidadania originária previamente concedida aos filhos, é eliminado.
Caráter discricionário: A maioria das vias de naturalização (exceto as de regime-regra, menores e apátridas) será tendencialmente discricionária, não sendo um direito fundamental.
Gratuitidade: A gratuitidade dos procedimentos de naturalização será limitada.
Perda da Nacionalidade – Artigo 8.º:
Introdução de uma pena acessória de perda da nacionalidade portuguesa para cidadãos naturalizados que, tendo outra nacionalidade, forem condenados a pena de prisão efetiva igual ou superior a cinco anos por crimes graves (contra a vida, terrorismo, criminalidade organizada, contra o Estado), cometidos nos 10 anos posteriores à aquisição da nacionalidade.
O tribunal deverá considerar a gravidade dos fatos, personalidade, grau de inserção na comunidade e tempo de residência legal.
Impedimento de novo pedido de naturalização por 10 anos após a perda.
Oposição à Aquisição da Nacionalidade – Artigo 9.º:
Os fundamentos de oposição incluem a inexistência de laços de efetiva ligação à comunidade nacional (considerando os novos requisitos do Artigo 6.º, n.º 1, alíneas c) a g)).
Não há oposição à aquisição por casamento/união de facto com mais de seis anos ou filhos em comum (com nacionalidade portuguesa), exceto por fundamentos relacionados a condenação criminal grave ou perigo para a segurança nacional (alíneas f) e g) do Artigo 6.º, n.º 1).
Consolidação da Nacionalidade – Artigo 12.º-B:
A titularidade de boa-fé da nacionalidade portuguesa por pelo menos 10 anos será causa de consolidação, mesmo que o ato de atribuição ou aquisição seja nulo.
É eliminado o prazo curto de 18 meses para consolidação da nacionalidade de menores, que não fazia sentido no contexto de "boa-fé".
Conceito de Residência Legal – Artigo 15.º:
Para efeitos de contagem de prazos, a soma de todos os períodos de residência legal (seguidos ou interpolados) será considerada, mas o intervalo máximo para essa soma é reduzido de 15 anos para 6, 9 ou 12 anos, dependendo se o interessado é apátrida, lusófono ou cidadão de outros países, respetivamente.
Não será considerado como tempo de residência legal o período de permanência em Portugal ao abrigo do instituto da "manifestação de interesse" (já revogado) e o tempo decorrido entre o requerimento de autorização de residência temporária e o seu deferimento.
Aplicação no Tempo (Regra Transitória) – Artigo 5.º:
A nova lei aplica-se em geral para o futuro, ou seja, aos procedimentos iniciados após a sua entrada em vigor.
No entanto, as alterações referentes aos requisitos do regime-regra de naturalização (Artigo 6.º, n.º 1) serão aplicadas a procedimentos pendentes que tenham sido iniciados a partir de 19 de junho de 2025 (data da viabilização do Programa do XXV Governo Constitucional).
Esta medida busca evitar o "movimento de submissão massiva de pedidos" feito na expectativa de beneficiar do regime anterior, considerado excessivamente permissivo e desprovido de uma ligação efetiva e genuína. A jurisprudência constitucional não impede alterações de leis aplicáveis a processos pendentes, especialmente quando as expectativas não são legítimas.
A proposta, portanto, representa um endurecimento significativo das condições de acesso à nacionalidade portuguesa, tanto originária quanto derivada, com o objetivo de restaurar a credibilidade do vínculo de cidadania e alinhar a legislação com os princípios de ligação efetiva e genuína exigidos pelo Direito Internacional e da União Europeia.
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